Há três meses ninguém joga. Não que
não queiram. Vem o pessoal das roças do entorno, como fazem todos os sábados e
domingos há muitos anos, com bola, camisa, algumas chuteiras velhas, mas ele
não deixa.
Não é o dono. Mas sua casinha fica
bem na lateral e ele é quem sempre cuidou, com enxada, ancinho, remédio,
trocando os bambus das traves – tornou-se assim a autoridade natural do espaço.
E segue, na quarentena, cuidando como
antes. A grama é um tapete.
Decidiu, no começo da pandemia, que
não haveria jogo. E assim tem sido, mesmo com a insistência de todos.
Como fabrica queijo e rapadura por
ali mesmo, não há brecha pra ninguém tentar na sua eventual ausência.
Só ele é quem, mesmo já idoso, magro,
tarde da noite, vai escondido com a bola meio murcha e a põe na imaginária
marca do pênalti.
Afasta-se um pouco, larga o chinelo e
toca no cantinho. Fica vendo-a, no escuro, deslizar até passar a trave.
Ergue os dois braços e sorri.
Isso todas as noites, desde o início
da quarentena.
Imagina que sem isso – muito mais do
que sem capinar, tirar pragas, arrancar formigueiros – o campinho morreria.
De manhã, pitando, constata que está
certo.
(Texto
de Luiz Guilherme Piva)
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