Você não está
lendo o texto errado. Foi Clarence Seedorf, a maior contratação da história do
Botafogo, que financiou a reforma de R$ 300 mil do hospital por meio de sua
fundação Champions for Children, instituição sem fins lucrativos que desenvolve
projetos sociais no mundo todo, começando pelo Suriname, terra natal do
jogador. O camisa 10 participou da cerimônia de inauguração do setor e visitou
o país duas vezes para acompanhar os trabalhos. Logo apoiada pelo governo, a
iniciativa acelerou um processo que levaria entre cinco e dez anos de acordo
com os profissionais do hospital.
Seedorf é assim:
quando o procuramos no campo, está cuidando dos projetos sociais. Quando
achamos que está no Brasil, está no Suriname. Ou na Itália. Ou nos Estados
Unidos. Tem uma grande ação para cada um dos sete idiomas que fala (português,
holandês, francês, inglês, italiano, espanhol e o crioulo).
O berço vem em
primeiro lugar. A inscrição "mi sab' dat mi lob Srana" (sei que amo o
Suriname) está na entrada da unidade neonatal. Seedorf nasceu em 1975, um ano
depois da independência do País, saiu ainda jovem e adotou a cidadania do
colonizador, a Holanda. Mesmo assim, transformou em lenda o sobrenome do avô,
filho de escravos que, apesar da alforria, carregou o Seedorf do antigo senhor
alemão.
Daria para fazer
um livro sobre os projetos sociais de Seedorf, mas, por questões de espaço, vai
tudo em sete linhas: a Champions for Children possui seis projetos em vários
países, entre eles, Camboja, Quênia e Brasil. Em Salvador, o craque investiu R$ 50
mil na construção de um centro de recreação e esportes no bairro de Alagados,
um dos mais pobres da Bahia.
Esse
comprometimento chegou aos ouvidos de Nelson Mandela. Em 2009, o jogador foi
condecorado como membro do "Champions Legacy", grupo que ajuda a
manter o legado do líder sul-africano. São só bambambãs, como David Rockefeller
e Bill Clinton, que se destacam por esforços filantrópicos no mundo. E Seedorf
muda para o inglês.
"Testemunhar
a fome que estrangulava a Etiópia na década de 80, quando eu era apenas uma
criança, teve um efeito profundo em mim e despertou meu desejo de dar forma ao
meu destino", declara em tom solene na apresentação de sua fundação.
Entre tantas
línguas, o coração do craque escolheu a de Camões. Ou melhor, a de Neguinho da
Beija-flor. Quando Seedorf e a brasileira Luviana completaram sete anos de
casamento, o holandês preparou uma festa surpresa em Milão. Mandou chamar o
puxador de samba e pediu que cantasse a preferida da amada: a música Negra
Ângela (Hoje eu vi um lindo negro anjo/Anjo negro, lindo anjo/Negra Ângela).
Esse foi um dos
pontos altos de uma história de conto de fadas. Os dois se conheceram no início
da década de 90, quando Luviana, então passista da Mocidade Independente de
Padre Miguel, viajou com a escola para uma temporada de shows na Itália. Ela
era de família humilde, moradora do Realengo que ganhava a vida com
apresentações como mulata. "Foi o casamento de um príncipe e uma princesa",
derrete-se o compositor Jorginho Estrela Negra, uma espécie de cupido e amigo
do casal até hoje.
Jorginho conta que
Luviana é uma primeira dama com jeito de primeira ministra. Foi ela quem bateu
o pé para que o jogador aceitasse a proposta do Botafogo, deixando de lado uma
oferta salarial de R$ 1,5 milhão por mês do chinês Guangzhou Evergrande, mesmo
time do argentino Darío Conca, além de outras propostas de cair o queixo da
Inglaterra, Estados Unidos e Catar. Seedorf balançou, mas cedeu (no Botafogo,
recebe por volta de R$ 700 mil de salário, além de luvas de R$ 1,5 milhão).
"Prevaleceu a vontade dela de voltar ao Brasil e vê-lo no seu time do
coração".
O desejo de
Luviana foi compartilhado por duas mil pessoas, que foram ao aeroporto para
recebê-lo em julho, quando assinou contrato de dois anos. E o exército de
"seedorfianos" não para de crescer. Em apenas três meses no Botafogo,
Seedorf conseguiu resgatar parte do orgulho dos torcedores, que amargam um
jejum de 17 anos sem títulos nacionais. Levantamento do departamento de
Marketing do clube aponta que o número de sócios-torcedores triplicou, passando
de quatro para 12 mil desde que o holandês chegou. "O torcedor reagiu à
chegada do Seedorf quase como se fosse um título", compara o diretor de Marketing
Marcelo Guimarães.
O
holandês não joga só com o nome. Ele fica no meio do caminho entre a prosa
europeia (direta, vertical, rumo ao gol) e a poesia latina (a imprevisibilidade
do drible). No Campeonato Brasileiro, vem se reinventando como atacante.
Jogando mais avançado, marcou sete gols em 14 jogos - faltam três para ele
quebrar seu recorde em uma temporada. "Ele é parecido com o Chico Buarque:
quietinho, na dele, mas agrada todo mundo", comparou o técnico Oswaldo de
Oliveira. "Todos falam que penso e jogo como brasileiro e isso está me
ajudando", diz o atleta que passou as férias no Rio nos últimos dez anos.
Seedorf está aqui,
mas continua em todo lugar, em sete idiomas. A assessoria de imprensa do
Botafogo tem um calhamaço com 40 solicitações de entrevistas, entre elas, da
Holanda, Itália e até Austrália. No Suriname, o apresentador de TV Desney Romeo
afirma que a audiência do seu programa semanal "Futebol no Brasil",
transmitido às segundas-feiras pela emissora ABC, aumentou com a contratação do
meia. Como o Suriname ainda tem dificuldades para medir a audiência, o
apresentador se baseia na participação ao vivo dos telespectadores para tirar a
conclusão. "Na próxima semana, vou sortear uma camisa do Botafogo",
orgulha-se.
Essa camisa ainda
não é tão comum como a do Milan, Ajax, alguns dos times que Seedorf defendeu. O
clube carioca ocupa poucas linhas em sua biografia. Pudera. Esse amor tem
apenas três meses, é prematuro e ainda não consegue respirar direito. Precisa
de cuidados especiais em uma unidade neonatal. Mas Clarence já está cuidando
dos sofridos pulmões dos botafoguenses.
1
vdk
===Fogata (271)===
3 comentários:
Eu conheço no Suriname as cidades de Albina e Paramaribo é uma ex colonia Holandeza muito pobre governada pelos militares, não conhecia a história da ajuda para o Hospital e demais ações humanitárias, já admirava seu futebol, agora admiro também o homem!
STSF Olavo
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Boa noite, The Best Olavo!
Parabéns pelo Tetra do Fluzão!
Parabéns pelo coração caridoso do Clarece Seedorf, também!
:o)
O meu Botafogo precisa de uma dezena de Seedorfs.
Parece que o Nêgo See sozinho não será capaz de alçar o Botafogo a voos mais altos.
O meu Fogão se mostra imbatível na hora de decepcionar.
Quando parece que o time vai embalar e ocupar um lugar na parte de cima da tabela, vem a frustração.
PQP!
:o(
The Best Abraço.
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Com profissionalismo, atitude e educação, Seedorf está mexendo com o dia a dia do futebol do Botafogo. Recentemente, ao chegar no Engenhão para um jogo, o meia não gostou de ver os uniformes atirados dentro dos armários dos atletas. Chamou os roupeiros e explicou que a camisa é um símbolo do clube, precisa ser tratada com carinho e esmero. Desde então, os jogadores passaram a encontrar os uniformes sempre pendurados em cabides nos dias de jogos.
Seedorf não descuida também dos companheiros. Noutro dia, percebeu que o zagueiro Brinner, de 25 anos, não estava se empenhando num treino e não perdoou: "Você é um garoto, pode dar mais". Os jogadores já estão se acostumando. Um deles disse que, após os dois gols marcados contra o Corinthians, Seedorf ficaria ainda mais exigente. "Vamos ter que aguentar o negão", brincou.
Até os dirigentes precisaram mudar seus hábitos. Recentemente um deles foi ao vestiário, aos gritos, cobrar mais empenho dos jogadores. Educadamente, o holandês disse que o vestiário não era local para esse tipo de cobrança e pediu que o cartola saísse, o que de fato aconteceu. Os jogadores adoraram.
Fonte: Coluna Panorama Esportivo – O Globo
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